Allan Kardec, Léon Denis e a Educação do homem
Coluna “O Médium de ontem”
Elaine Curti Ramazzini
Publicado na revista O Médium no 568, de novembro/dezembro de 1992
A educação, convenientemente entendida, constitui a chave do progresso moral.i
Nas notas à questão 917 de O Livro dos Espíritos, Allan Kardec aponta diretrizes que visam ao progresso da Humanidade, isto é, a extinção do egoísmo, visto pelo Codificador como verme roedor e grande chaga social. Na introdução de O problema do ser, do destino e da dor, Léon Denis assegura que “a educação é o mais poderoso fator do progresso, pois contém em gérmen todo o futuro”, e que “a educação que se dá às gerações é complicada; mas, não lhes esclarece o caminho da vida; não lhes dá a têmpera necessária para as lutas da existência.”ii
Tanto o mestre de Lyon como Denis afirmam, de maneira clara, direta e insofismável, que a verdadeira educação não visa instruir os homens, mas elevar o seu moral, inspirando-os na ação, no amor, na dedicação, ou seja, desenvolvendo neles mais que o intelecto, o sentimento. Acrescente a isso, segundo Denis, a necessidade de se lhes sensibilizar quanto a uma nova concepção de vida e de destino, com vistas às energias profundas do “eu” e à orientação, de maneira elevada, de seus impulsos e esforços.
Vivemos, atualmente, num momento de crise que solapa valores, empana virtudes e amedronta a criatura pelo conflito de interesses e pelo enfraquecimento do sentimento do dever, da justiça, do respeito e, acima de tudo, pela sua postura de afastamento no que se refere à assunção da responsabilidade perante si mesmo, o próximo e Deus, conforme apontam as notas de Allan Kardec na questão 917 de O Livro dos Espíritos. A inércia e a imobilidade diante do status quo, de um mundo em constante mudança, tornaram o homem pusilânime, desconfiado, desamparado e triste.
Kardec menciona que quando “se conhecer a arte de manejar os caracteres como se conhece a de manejar as inteligências, conseguir-se-á corrigi-los, do mesmo modo que se aprumam plantas novas”. E Léon Denis, ao examinar a sociedade como “a resultante das forças individuais, boas ou más”, assegura que “para se melhorar a forma dessa sociedade, é preciso agir primeiro sobre a inteligência e sobre a consciência dos indivíduos”. Para ele, “nenhuma obra humana pode ser grande e duradoura se não se inspirar na teoria e na prática, em suas explicações, nas leis eternas do Universo”. Assim, a educação, para ser completa, deve ter como base o estudo da vida visível e invisível, “em sua plenitude, em sua evolução ascendente para os cimos da natureza e do pensamento”.
Aí é que vamos sentir o papel do educador nesse contexto de renovação do ser, de educação da alma: o de recolocar o Espiritismo na base da educação, renovando o homem interior, a fim de que essas modificações se reflitam no exterior.
Num processo harmonioso de interação entre educador e educando, tais verdades encontrarão ambiente propício para fecundar. Segundo Kardec, se se fizer “com o moral o que se faz com a inteligência, ver-se-á que, se há naturezas refratárias, muito maior do que se julga é o número das que apenas reclamam boa cultura, para produzir bons frutos”.
Referindo-se aos educadores, Léon Denis menciona um dever imediato a cumprir, qual seja, o de embasar o processo educativo nos postulados espíritas, trabalhando para refazer o interior da criatura, bem como a sua saúde moral. Segundo ele, “é necessário despertar a alma humana adormecida por uma retórica funesta; mostrar-lhe seus poderes ocultos, obrigá-la a ter consciência de si mesma, a realizar seus gloriosos destinos”.
Ao final de suas notas, Kardec prescreve como condições básicas dessa tarefa a que ele chama de arte, “muito tato, muita experiência e profunda observação”. Isso porque a missão de educar deve ser, sobretudo, a de sensibilizar a individualidade, tendo como enfoque o ser humano integral, pois que não é ele apenas o ser inteligente, mas o ser afetivo e o ser social, com um acervo de experiências vividas, sofridas e sentidas em reencarnações transatas. Trabalhar, pois, com o homem numa visão espiritualista é, sem dúvida, estimulá-lo para que, enquanto Espírito responsável, mobilize a vontade, direcione o pensamento de maneira firme e aprimore os sentimentos, para que estes se depurem incessantemente na sua ascese evolutiva em demanda ao Pai.
i KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro: FEB, 2010, nota à questão 917.
ii As citações seguintes são também dessas duas obras.