Vianna de Carvalho

Luciano Klein Filho

Manoel Vianna de Carvalho nasceu em Icó, Ceará, a 10 de dezembro de 1874. Era filho de Tomás Antônio de Carvalho, professor de Música e Língua Portuguesa da Escola Normal, e de Josefa Vianna, mulher de raras virtudes.

 Em Fortaleza, estudou no Liceu do Ceará. Em 1891, matriculou-se na Escola Militar do Ceará, onde se destacou pelo brilho de sua inteligência. Nesse mesmo ano, juntamente com outros cadetes, conheceu o Espiritismo, organizando um grupo de estudos doutrinários na própria escola.

Em 1894, ainda na capital cearense, avultou como poeta, participando da fundação do Centro Literário, agremiação dissidente da célebre Padaria Espiritual. No ano de 1895, transferiu-se para o Rio de Janeiro, matriculando-se no Curso Superior da antiga Escola Militar da Praia Vermelha. Passou a frequentar a União Espírita de Propaganda do Brasil.

Ali, Vianna de Carvalho, o mais jovem e o mais ardoroso dos trabalhadores do grupo, ocupou a tribuna, quase todas as noites, perante compacto auditório. Sua aparência juvenil não fazia diferença, porque seu verbo inspirado e eloquente embevecia os ouvintes, concorrendo para aumentar, diariamente, o número de curiosos por ouvi-lo.

Foi transferido para Escola Militar de Porto Alegre em 1896. Procurou, então, alguns confrades e numa casa abandonada, desprovida de mesas e cadeiras, dentro de um terreno baldio no bairro do Parthenon, começou a divulgar o Espiritismo. Em seguida, fundou um núcleo de estudos no andar térreo de uma casa comercial, na Rua dos Andradas. Convocou diversas pessoas, entre as quais Mercedes Ferrari, que animada pelo cadete Vianna e com o apoio de outros companheiros, deu grande impulso ao Movimento Espírita local.

Ainda em 1896, regressou ao Rio de Janeiro, retomando os trabalhos na União Espírita de Propaganda do Brasil, passando a ser requisitado para proferir conferências em todo o Distrito Federal, na época no Rio de Janeiro.

No ano de 1898, de novo em Porto Alegre, publicou a sua primeira obra literária, intitulada Facetas, cuja segunda edição, lançada em 1910, foi prefaciada pela poetisa Carmem Dolores, pseudônimo da escritora Emília Bandeira de Melo. O livro mereceu os melhores elogios da crítica. Em 1923, publicou Coloridos e Modulações, coletânea de suas crônicas escritas durante vários anos em periódicos espíritas e literários. A obra foi igualmente muito bem recebida.

Em 1905, foi transferido para o 8o Batalhão de Infantaria, em Cuiabá. Naquela cidade, fundou o Centro Espírita Cuiabano, em 1906, dotando-o do necessário ao seu bom funcionamento, sendo seu primeiro presidente. Em 1907, retornou ao Rio de Janeiro, a fim de se matricular no curso de Engenharia da Escola Militar do Realengo. Dessa vez, realizou uma série de conferências na Federação Espírita Brasileira e no auditório da antiga Associação dos Empregados do Comércio, com plateias cada vez maiores. Foi convidado para conferências em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e em todo o estado do Rio de Janeiro, sendo, em muitas destas excursões, acompanhado por Ignácio Bittencourt, diretor do jornal Aurora, em cujas páginas Vianna emprestou a sua colaboração, como em tantos outros periódicos espíritas e laicos em todo o país e em Portugal.

Em 1910, concluiu o curso de Engenharia Militar, embarcando para Fortaleza em abril deste mesmo ano. O Espiritismo no Ceará floresceu na última década do século XIX, em Fortaleza, mercê da persistência do grande pioneiro Luiz de França de Almeida e Sá, fundador do Grupo Espírita Fé e Caridade. Na virada do século, surgiram mais dois grupos na cidade de Maranguape, o Verdade e Luz, que chegou a editar, em 1901, o jornal Luz e Fé; e o Caridade e Luz, organizado em agosto de 1902 e que também publicou um jornal denominado Doutrina de Jesus e manteve uma instituição de ensino, a Escola Cristã, de 1902, uma das primeiras escolas vinculadas a uma sociedade espírita no Brasil. Contudo, lamentavelmente, esses grupos de reuniões familiares não tiveram longa duração, não mais existindo quando da chegada de Vianna.

O grande ímpeto da Doutrina dos Espíritos no Ceará só ocorreu, efetivamente, a partir de 1910, com a chegada de Vianna. Sua estada em Fortaleza, de maio daquele ano até novembro de 1911, foi pródiga de realizações. Seu acendrado amor à causa espírita o impulsionou a um ritmo de ação incansável.

Logo ao chegar, procurou arregimentar forças para a organização do Movimento Espírita local. Publicou, repetidas vezes, nas páginas do jornal Unitário, anúncios e pedidos como este:

Peço aos espíritas do interior do Ceará, bem como aos socialistas, maçons, livres pensadores, adeptos em geral das ideias modernas, o obséquio de me enviarem os seus endereços para fins de propaganda. Vianna de Carvalho. Endereço: Rua 24 de Maio, no 26

Em seguida, promoveu o estudo sistemático de O Livro dos Espíritos, efetuando conferências nos salões das lojas maçônicas Amor e Caridade, Igualdade e Liberdade semanalmente. Essas preleções passaram a ser publicadas nos jornais Unitário e A República.

As conferências tiveram repercussão extraordinária, motivando imediata reação de líderes católicos, os quais, através dos jornais Cruzeiro do Norte e O Bandeirante, combateram o Espiritismo e seu fiel arauto. Essa campanha insidiosa, em vez de prejudicar, aumentou grandemente o interesse pela doutrina criticada.

Entretanto, o corolário do profícuo labor desse filho de Icó foi a fundação, em junho de 1910, do Centro Espírita Cearense, que funcionaria na Rua Santa Isabel, no 105 (hoje Rua Princesa Isabel, no 255), bem no coração da cidade.[1] O Centro Espírita Cearense passou a desenvolver notável serviço no campo da propaganda doutrinária (promoção de estudos, conferências, criação do jornal O Lábaro etc.) e no campo assistencial.

A partir de Fortaleza, Vianna sofreria intensa perseguição de influentes membros da Igreja, que passaram a pleitear, junto às autoridades militares, sua transferência. Assim, em novembro de 1911, depois de um ano e seis meses de grandes serviços prestados à causa espírita, partiu para a capital federal.

Em outubro de 1923, regressou à Fortaleza como chefe interino do Estado Maior da 7a Região Militar, com sede em Recife, no desempenho de importante comissão do Ministério da Guerra. Aproveitou a oportunidade para rever amigos e realizar conferências no Centro Espírita Cearense, que então já possuía sede própria, e na Loja Liberdade. No entanto, sua permanência foi somente de poucos dias.

No dia 10 de abril de 1924, voltou, desta feita, para assumir as funções de fiscal do 23o Batalhão de Caçadores. Largo círculo de seus amigos e admiradores o recepcionou com alegria no ponto de desembarque. Em julho desse ano, assumiu o comando interino do referido batalhão.

Permaneceu em Fortaleza até 11 de setembro de 1924. Nesse ínterim, proferiu conferências e participou de atividades culturais. Decorridos treze anos de sua fecunda tarefa na organização do Movimento Espírita Cearense, não enfrentou as mesmas resistências da outra vez, porquanto, além do respeito que lhe impunha os novos posto e função, vários intelectuais, figuras conspícuas da sociedade fortalezense, haviam se convertido ao Espiritismo. Sobressaindo destes, estava o tenente-coronel Francisco de Sá Roriz (1870 – 1925), que fora chefe de polícia no governo do general Setembrino de Carvalho e fundador, em 1916, da Faculdade de Farmácia e Odontologia.

No Rio de Janeiro, juntamente com Ignácio Bittencourt, fundou a União Espírita Suburbana; com Arthur Machado, fundou a Tenda Espírita de Caridade. Realizou inúmeras conferências públicas no Cine-Teatro Odeon e na Escola Nacional de Música.

Vianna percorreu as principais cidades brasileiras do início do século XX. Em Recife, onde já era grande sua fama, fundou, com Antônio José Ferreira Lima e Manoel Aarão, a Cruzada Espírita Pernambucana, em 1923. Pregou no Cine-Teatro Polytheama e no Teatro Santa Isabel. Os jornais A Província e o Diário de Pernambuco veiculavam que a assistência para ouvi-lo era incalculável e seleta, com pessoas de todas as classes sociais.

Foi ele quem, em 1914, levantou a campanha para evangelização das crianças nos centros espíritas, sugerindo a criação das aulas de moral cristã.

Em 1926, quando servia em Aracaju, adoeceu gravemente, vitimado por um tipo grave de beribéri. Era o comandante interino do 28o Batalhão de Caçadores no posto de major. Diante da gravidade do seu estado de saúde, os médicos resolveram encaminhá-lo para o Hospital de São Sebastião, em Salvador. Foi conduzido de maca até o navio Íris. Nas proximidades da praia de Amaralina, às 6h30 da manhã do dia 13 de outubro de 1926, desencarnou a bordo, aos 51 anos.


[1] Atualmente funciona no local a Federação Espírita do Estado do Ceará.

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