Firmeza de Convicção

Alcione Andries Lopes

Publicado na Revista O Médium, no 569, jan/fev/1993

Lento e progressivo é o aprendizado humano.

Bem trabalhar o germe da perfeição que trazemos, ínsito, por divina herança, fazendo-o desabrochar pela força do progresso, e pelo uso adequado dos recursos de crescimento que nos põe a disposição a eterna Sabedoria, é das mais árduas tarefas[i]. Isto ocorre porque, além de outros fatores, um há de essencial importância e de pouco emprego: o esforço pessoal, consciente, no desenvolvimento e consolidação das virtudes.

Nesse processo de iluminação do Espírito, dois complicadores existem: (a) nosso passado de equívocos e erros que, milenarmente repetidos, se transformam em hábitos, os quais nos induzem à rotina das repetições, que se manifestam em pendores menos felizes e na instabilidade das qualidades positivas que porventura abriguemos, (b) a convivência com sugestões e  convites distanciados das diretrizes divinas, os quais encontram eco em pré-disposições que possuímos, exatamente em virtude do que foi dito no item (a).

Esta característica de nosso desenvolvimento pode ser comparada à seguinte situação: um indivíduo subindo uma escada, com um pé colocado, de leve, na beirada do degrau superior, enquanto o outro se apoia totalmente no degrau de baixo. Embora sabendo que deverá subir, porque sua destinação é o alto; embora a existência de corrimão que lhe serve de amparo, a pessoa vacila quando tenta mudar o passo, porque seu apoio na parte de cima é fraco, enquanto a “estabilidade” na estrutura mais baixa é bastante cômoda, exigindo-se, assim, do candidato, a ascensão, um grande e permanente esforço, para a superação desse estado de coisas.

Ainda que o conteúdo da mensagem cristã o mais precioso e seguro recurso de elevação para o homem, nos venha batendo às portas do entendimento e do coração desde sempre, através dos Prepostos do Cristo, e Dele próprio, bem pequena é a fração de progresso que efetivamente conseguimos consolidar em nós: consolidação que se mostra na ação que confirma o discurso, ou seja, na prática que corrobora a fé. Porque muitos aceitamos a palavra libertadora do Cristo, sem que a consigamos vivenciar. Mas, já é alguma conquista, é o progresso em vias de se realizar, pois que nos deixamos, pelo menos, sensibilizar pela ideia do bem[ii]. Faltam o empenho e a perseverança da criatura para se passar do sonho à realização, da ideia à prática, do projeto à execução.

Observando a divulgação, pela mídia, de fatos de extrema violência que vem grassando em todas as camadas sociais, detectamos como retornam, revigoradas, propostas de “soluções” há muito banidas pelo bom senso e pela própria evolução das leis humanas.

Ao influxo da paixão ensandecida pela revolta, pelo medo, não poucos têm obliterada a capacidade de raciocinar com a lógica (já não dizemos com serenidade, muito difícil de ser mantida quando a dor se faz superlativa e a fé não é nem do tamanho de um grão de “mostrada”…). Deixam-se subjugar por sugestões de parte dos veículos de comunicação que açulam o desequilíbrio, e ficam de “cabeça feita” por convicções até mesmo contrárias àquelas que anteriormente cultivavam como princípios filosóficos ou religiosos, exatamente porque tais lhes estão pouco enraizados na individualidade.

A pressão maciça exercida por programas de TV, rádio, jornais e revistas que privilegiam as sensações, o imediatismo, o ganho a qualquer preço, o poder temporal, faz-se, quando a crença iluminada é frágil e vacilante, numa onda devastadora, que não só acende ideias espúrias, quanto induz a derrocada de valores morais, os quais se vão esgarçando, de concessão em concessão, até que se passa a aceitar, por normais, desvios graves de comportamento, que devem merecer o incentivo ao reajuste, e não à acomodação.

Ante tudo isto, para não cairmos, como incautos, nessa correnteza atormentada da desorientação, que fatalmente deságua no mar das desilusões e dos penosos recomeços, que nos resta fazer? Como desenvolver e consolidar a convicção espírita, a crença inabalável, a aceitação plena do Mestre e Sua mensagem como Caminho, Verdade e Vida? Em primeiro lugar é preciso o conhecimento sempre mais aprofundado desta mensagem, principalmente pelo estudo; em segundo lugar, a reflexão sistemática sobre a proposta do Cristo, o que facilita a assimilação interior; e, por último, a aplicação dos postulados aos atos de cada dia, do mais simples ao maior, do aparentemente inexpressivo e corriqueiro àquele capaz de influenciar dezenas de inteligências outras.  

Reforçando as exortações de Jesus, já nos sugeria Paulo, ao se dirigir aos hebreus (Hb 1:12):

“Portanto, também nós, visto que temos a rodear-nos tão grande número de testemunhas, desembaraçando-nos de todo peso, e do pecado que tenazmente nos assedia, corramos com perseverança a carreira que nos está proposta”.


[i] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, q. 779 e 783

[ii] XAVIER, Francisco Cândido. Pensamento e vida, pelo Espírito Emmanuel, c. 20

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