Sopro inteligente da Vontade Divina

Valéria de Araújo Torres

“Ao sopro inteligente da Vontade Divina, condensa-se a matéria cósmica no organismo do Universo. Surgem as grandes massas das nebulosas e, em seguida, a família dos mundos, regendo-se em seus movimentos pelas leis do equilíbrio, dentro da atração, no corpo infinito do cosmo.” [1]

Do micro ao macrocosmo, da existência dos seres inanimados aos seres viventes, a ciência humana organiza e estrutura todos os elementos e seres em famílias – pela semelhança, origem, classe, ordem, gênero e espécie, seguindo leis, incluindo a da evolução. Jesus, nos Evangelhos, como “caminho, verdade e vida” (Jo 14:6), apresentou o Criador como Pai, declarou-se como filho, estendeu os seres humanos como família universal e exemplificou nas núpcias o símbolo maior de celebração abençoada por Deus. Isso porque “temos, dessa forma, no instituto doméstico, uma organização de origem divina, em cujo seio encontramos os instrumentos necessários ao nosso próprio aprimoramento para a edificação do mundo melhor.”[2]

Como ser social que é, o ser humano, nos planos divinos, estrutura-se pela interdependência e pela influência na convivência e nas relações de seus pares, a começar pelo núcleo familiar, com o estabelecimento do casamento ou união permanente entre dois seres, registrado como “um progresso na marcha da humanidade.”[3] É no regime de convivência e assistência mútua, com base na responsabilidade recíproca, que se estabelece o caminho para o saneamento de débitos contraídos no passado entre o casal, promovendo a metamorfose afetiva no cumprimento da missão da maternidade e da paternidade, a partir da tarefa, nem sempre amena, da autoeducação.

Falar de família, portanto, é falar do compromisso espiritual e de sua estruturação na vida do ser, já que a encarnação é imposta ao Espírito com o objetivo de conduzi-lo à perfeição, reunindo sob o mesmo teto, pelos laços de sangue, almas não necessariamente afins. E, para aprender a suplantar as vicissitudes da existência corporal, deixando sua contribuição pessoal na obra da criação, a constituição do núcleo familiar, dentro da estrutura do programa divino, no tocante à sua manutenção física e no desenvolvimento da inteligência do Espírito, demanda o esforço pessoal de cada individualidade em domar suas más inclinações no cumprimento de seus deveres morais.

O Espírito Emmanuel, na obra Emmanuel, psicografada por Chico Xavier, compenetrado da importância do instituto da família como a associação mais importante, por sua função educadora e regenerativa, ditou como prioridade para esse fim o estabelecimento do Evangelho no Lar, por compreender que “evangelizado o indivíduo, evangeliza-se a família; regenerada esta, a sociedade estará a caminho de sua purificação, reabilitando-se simultaneamente a vida do mundo”. Isso porque o Evangelho é o tratado do amor vivido, sentido e praticado por Jesus, e, no caminho dos homens, o amor é o sentimento que preside “todas as atividades da existência em família e em sociedade.”[4]

Desse modo, o casal é convidado ao estabelecimento de uma visão espírita da vida na sua feição evangélica, conduzindo a família a ver o ser humano para além do seu complexo celular, despertando o entendimento da finalidade do presente, da certeza do seu futuro espiritual e da existência de suas faculdades sensoriais, com fim à consecução dos projetos grandiosos de fraternidade e de paz da humanidade, já que “toda a tarefa, no momento, é formar o espírito genuinamente cristão; terminado esse trabalho, os homens terão atingido o dia luminoso da paz universal e da concórdia de todos os corações.”[5]

Em função das transformações sociais, culturais e familiares ocorridas, desde o último século, o papel das figuras paterna e materna vem passando por mudanças significativas na sociedade humana. A importância desses papéis, tanto para o filho, quanto para a família, é reconhecida pela ciência atual – o que os Espíritos Superiores já revelam nas obras espíritas – como de grande importância na estruturação psíquica e no desenvolvimento social e cognitivo da criança, logo, do futuro adulto. Nesse sentido, Fénelon, na questão 917 de O Livro dos Espíritos, enfatiza que o ser humano “sofrerá assim a influência moralizadora do exemplo e do contato.”[6] Enfim, a proposta espírita impacta com profundidade os costumes, o caráter, os hábitos e as crenças da família, que tão grande influência exercem sobre as relações sociais, pavimentando o progresso da humanidade rumo à fraternidade, à liberdade e à solidariedade universal.


[1] XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador. Pelo Emmanuel. 26a ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006, q. 21.

[2] XAVIER, Francisco Cândido. Vida e Sexo. Pelo Emmanuel. 22a ed. Rio de Janeiro: FEB, 2001, c. 2.

[3] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 695.

[4] XAVIER, Francisco Cândido. O Consolador. Pelo Emmanuel. 26a ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006, q. 322.

[5]  XAVIER, Francisco Cândido. Emmanuel. Pelo Emmanuel. 22a ed. Rio de Janeiro: FEB, 2001, c. 35.

[6] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 917.

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