De “O Médium” de ontem: A paz começa em casa

Alcione Andries Lopes
Publicado na Revista O Médium, ano 54, no 535, jan/fev/1987

Após a apresentação de estatísticas que nos chocam pela crueza de sua realidade – “seis mil crianças morrem ou ficam mutiladas, anualmente, no Brasil, pela violência dos pais contra elas” –, a televisão encerra a mensagem com um apelo à paz, usando a expressão que encima estes comentários.

O que leva alguém a agredir, com tamanha brutalidade, um ser que lhe é ligado por laços familiares, fragilizado num corpinho infantil, incapaz de reagir ante a truculência do mais forte ou da “autoridade” do mais velho?

Vejamos algumas explicações encontradas pelos que lidam mais de perto com o problema: pais agridem filhos num extravasar de frustrações e revoltas; ou quando o álcool ou outras drogas lhes embotam a sensibilidade; ou quando se desesperam pela falta dos recursos mínimos de sobrevivência, como o alimento, a segurança de uma casa etc.. Pode ser, ainda, que o violento seja portador de um distúrbio mental, de uma neurose, enfim, de uma psicopatia.

A estes motivos, podemos acrescentar outros, que o conhecimento espírita nos enseja: Espíritos antipáticos ou francamente inimigos podem reencarnar como pais e filhos, e o mais forte nem sempre é capaz de transformar em amigo um antigo desafeto, deixando que aflore o rancor, mal dissimulado em incontrolável desejo de vingança; o ciúme entre Espíritos que reencarnam juntos para sublimar tendências pode vir à tona como resquício renitente de um passado infeliz; o egoísmo e o orgulho de um Espírito, que se encontre em oportunidade de desenvolver a humildade, estão permanentemente a insuflar-lhe à revolta que se extravasa, então, contra aquele que está sob sua autoridade. Os prezados leitores poderão aduzir, ainda, muitos outros motivos, mas o fato é que, qualquer que seja o motivo apresentado, ele indica uma fragilidade ou uma enfermidade espiritual, a exigir medicação urgente, sob pena de se acelerarem processos de demência e sofrimento a atingirem os violentos por centenas de anos.

E vejamos aqui que a violência contra os pequeninos não é apanágio dessa ou daquela classe social, porque as motivações profundas não são apenas ligadas a fatores externos, mas à problemática do Espirito reencarnado.

E o que se pode fazer para a erradicação da nefanda violência contra a criança?

É ainda a TV que aconselha denunciemos os fatos.

Nós espíritas, acreditamos, podemos ir mais além, não apenas apontando o mal, mas efetivamente combatendo-o pela raiz.

Primeiro é mister nos sensibilizemos; necessário enxergar a nossa volta, sentirmos no outro um irmão. E, reconhecendo a violência também em todas as manifestações mais sutis (se é que se pode chamar de sutil alguma coisa impregnada deste sentimento agressivo), como a indiferença, o autoritarismo, as “corrigendas” humilhantes, o revide sistemático às provocações, busquemos então socorrer vítima e ofensor, amparando-os no combate às causas imediatas da agressão e também na educação permanente para a alma.

Urgente é disseminar o conhecimento, em dose certa e oportunidade melhor, de que o primeiro passo para se combater a violência é pacificar os próprios pensamentos. Quem cria e mantém um clima de confiança operosa, de fé e bom ânimo, repele, realmente, as investidas da ira, da cólera, do “ataque nervoso”. Cientistas canadenses já identificaram uma substância secreta em maior profusão pelos otimistas, capaz de influenciar positivamente no equilíbrio emocional. É a Ciência corroborando o que a Doutrina Espírita ensina sobre o pensamento, sobre a interação mente-perispírito-corpo físico.

Pensar na paz, buscar a paz na fé e na prece, guardar a paz na vigilância dos pensamentos, e propagar estas verdades, este o caminho. E também repelir o ataque das sombras, fechando as portas da alma e do lar aos convites à violência que aparecem em publicações, em músicas, em filmes, em conversas infelizes. As ideias só se materializam quando alimentadas por nossa vontade e pensamento, ou pela nossa indiferença em dar-lhes combate.

E, retomando o título deste pequeno arrazoado, finalizamos dizendo que as considerações expendidas não são apenas norteadoras para nossas atividades no grupo espírita ou no meio social onde trabalhamos, mas aplicam-se principalmente em nossa atitude dentro do lar, pois, de acordo com a luminosa exortação de Paulo, na 1a epístola a Timóteo, “… se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos de sua própria casa, tem negado a fé, e é pior do que o descrente. ”

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