Para Kardec, os Espíritos desencarnados fazem sexo?
Coluna “Revista Espírita em destaque”
Ricardo Baesso de Oliveira
Os Espíritos desencarnados fazem sexo, ou seja, existem relações sexuais entre eles? As descrições do modo de vida na erraticidade, pela vasta obra mediúnica de Chico Xavier, reportam-se a Espíritos dormindo, se alimentando, namorando, mas intercurso sexual ocorre ou não?
A resposta é não, considerando o pensamento de Allan Kardec.
Em duas oportunidades, ambas registradas na Revista Espírita, Kardec expõe suas ideias de maneira indiscutível.
Na Revista Espírita de junho de 1862, após diálogo instrutivo com uma entidade que pertencera à Sociedade Parisiense, Kardec escreve: “Os sexos só são necessários para a reprodução dos corpos; porque os Espíritos não se reproduzem, o sexo lhes seria inútil.”
Ainda na Revista Espírita, de janeiro de 1866, Kardec volta ao tema com o mesmo posicionamento: “As almas ou Espíritos não têm sexo. As afeições que os unem nada têm de carnal e, por isso mesmo, são mais duráveis, porque fundadas numa simpatia real e não são subordinadas às vicissitudes da matéria.”
E ainda: “Os sexos só existem no organismo. São necessários à reprodução dos seres materiais. Mas os Espíritos, sendo criação de Deus, não se reproduzem uns pelos outros, razão por que os sexos seriam inúteis no mundo espiritual.” Admite o codificador que há entre eles amor e simpatia, mas baseados na afinidade de sentimentos.[i]
E, finalmente, examinando o sofrimento advindo das paixões inferiores, Kardec reproduz, em O Livro dos Espíritos, o seguinte pensamento dos benfeitores: “Embora as paixões não existam materialmente, ainda persistem no pensamento dos Espíritos atrasados.”[ii] Referindo-se à impossibilidade do intercurso sexual entre eles, comenta que esse tipo de paixão “causa suplício no espírito devasso que vê as orgias de que não pode participar.”[iii]
Isso poderia explicar os relatos mediúnicos sobre Espíritos atormentados pelas emoções sexuais, verdadeiros vampiros da sexualidade de encarnados imprevidentes. Impossibilitados de saciarem sua libido, se acoplam magneticamente a casais com os quais sintonizam, todos eles igualmente com a sexualidade desvinculada de um compromisso ético, absorvendo as emanações psíquicas liberadas durante a relação sexual.
Em O Livro dos Médiuns, Kardec escreve:
Nos Espíritos inferiores [seu períspirito] aproxima-se da matéria e é isso que determina a persistência das ilusões da vida terrena nas entidades de baixa categoria, que pensam e agem como se ainda estivessem na vida física, tendo os mesmos desejos e, quase poderíamos dizer, a mesma sensualidade.[iv]
O tema é complexo e está aberto a novas contribuições. Autores espíritas encarnados e desencarnados têm apresentado posições pessoais, sempre respeitadas. Esperamos ter colaborado para o debate, ao apresentar a linha de pensamento de Kardec.
[i] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed. Rio de Janeiro: FEB, 200, i. 200.
[ii] Idem, i. 972.
[iii] Idem, i. 972a.
[iv] Idem, O Livro dos Médiuns, 1a ed. Rio de Janeiro: FEB, 2008, i. 74.