Irradiação: o que os Espíritos precisam saber?

Daniel Salomão

A prática da irradiação, ainda que antiga em nosso Movimento Espírita, tem se intensificado nos últimos tempos devido ao momento de pandemia que enfrentamos. Grupos mediúnicos, que estão com suas reuniões mediúnicas temporariamente interrompidas, ou mesmo grupos específicos, têm saudavelmente ampliado seu trabalho de preces pelo próximo. Nesse texto, iremos discutir quais informações devemos fornecer aos Espíritos durante o trabalho de irradiação.

Conforme documento organizado pela FEB, “em Espiritismo, a definição para irradiação é transmissão de fluidos espirituais a distância.”[1] Desenvolvendo esse conceito, para o Departamento de Atendimento Espiritual (DAE) da AME/JF, “irradiação é a emissão de bons pensamentos, cujo objetivo é a doação a distância de boas energias àqueles que se encontram em necessidade.”[2]

Bases teóricas para essa prática não faltam. Segundo O Livro dos Espíritos, o fluido universal é o veículo de transmissão dos nossos pensamentos, estabelecendo entre os Espíritos “comunicação constante.”[3] Essa comunicação não depende de proximidade entre os interlocutores, encarnados ou desencarnados, pois o pensamento dos Espíritos “pode irradiar e dirigir-se para muitos pontos diferentes ao mesmo tempo”, o que varia segundo sua pureza.[4]

Imprimindo nesse pensamento boas qualidades[5], ou seja, desejando o bem ao alvo de nossa prece, “o pensamento do encarnado atua sobre os fluidos espirituais, como o dos desencarnados, e se transmite de Espírito a Espírito.” A atuação dessas energias sobre o perispírito de seu alvo acaba por atingir naturalmente seu organismo material, logo proporcionando bem-estar físico e emocional.[6]

Se essa ação realizada individualmente pode oferecer bons resultados, organizada em conjunto pode ser potencializada. Afinal, “reunidos pela comunhão dos pensamentos e dos sentimentos, os homens têm mais força para atrair a si os Espíritos bons.”[7] Isso chama nossa atenção ainda para outro aspecto. O trabalho de irradiação não envolve apenas as boas energias que remetemos, mas também a ação dos Espíritos, que também enviam bons pensamentos e se aproximam dos destinatários da tarefa para ações mais efetivas. Segundo Kardec, se a prece for ardente e sincera, “pode chamar os bons Espíritos em auxílio daquele por quem oramos, a fim de lhe sugerirem bons pensamentos e lhe darem a força de que precisam seu corpo e sua alma.”[8]

Todavia, se reconhecemos a atuação dos Espíritos nos trabalhos de irradiação, algumas questões compreensivelmente surgem. Que os Espíritos podem conhecer e mesmo ler nossos pensamentos, já sabemos.[9] Ainda que ouçam o som de nossa voz, “nos compreendem sem o auxílio da palavra, somente pela transmissão do pensamento.”[10] Logo, por que escrever nomes em papéis ou declamá-los em reuniões de irradiação?

Em primeiro lugar, essa é a forma mais simples e privada de alguém, no centro espírita, informar o nome da pessoa para a qual solicita a tarefa. Além disso, se entendemos que o pensamento do grupo pode ser mais forte que o individual, parece-nos natural que todos devam conhecer o nome do alvo de seus pensamentos, para que se facilite sua homogeneidade. Com relação aos desencarnados, compreendemos da mesma forma. Pelas informações acima, em nossas orações particulares, conversando diretamente com eles, podemos pedir auxílio por alguém e trazer as informações que julgamos importantes, apenas pelo pensamento. Entretanto, na reunião de irradiação, há uma equipe de trabalho também desencarnada, voltada aos nomes propostos pelo grupo, a qual seria poupada de verificar os pensamentos de cada um dos presentes e mesmo daqueles que solicitaram as preces, no momento em que pensavam ou escreviam os papéis! Logo, entendemos que a escrita dos nomes em papéis ou mesmo sua leitura em voz alta para a equipe tem a sua finalidade.

Contudo, o que precisamos informar aos Espíritos? Apenas o nome completo é suficiente? Ou também o local onde a pessoa mora ou está internada? Analisando a obra do Espírito André Luiz, pela mediunidade de Chico Xavier, alguns trechos podem ser esclarecedores sobre o assunto. Direcionamos nossa busca a trechos em que encarnados e/ou desencarnados solicitavam ajuda a outros Espíritos, o que nos mostrou ser o endereço uma importante informação. Por exemplo, na obra Entre a terra e o céu, Clarêncio é procurado por outro Espírito que rogava socorro para um encarnado querido. Após expor seu pedido, passa a conduzir Clarêncio ao local onde estava o encarnado.[11] Ainda que, na obra Nosso Lar, André Luiz chame Narcisa a distância apenas pelo pensamento, buscando o auxílio para determinado encarnado do qual estava ao lado,[12] é importante destacar que, em muitos outros casos, os próprios Espíritos vão até seus companheiros mais elevados para informá-los ou conduzi-los.[13] No caso de uma reunião de irradiação, onde os tarefeiros desencarnados não estão ao lado daquele para quem o grupo irradia, essa informação geográfica nos parece ainda mais importante. Um caso, todavia, parece-nos mais explícito.

Na obra Nos domínios da mediunidade, André Luiz acompanha os trabalhos mediúnicos de determinado centro espírita, especialmente os da médium Ambrosina.[14] No início dos trabalhos, “junto dela, em oração, foram colocadas numerosas tiras de papel. Eram requerimentos, anseios e súplicas do povo, recorrendo à proteção do Além, nas aflições e aperturas da existência. Cada folha era um petitório agoniado, um apelo comovedor.”

Entretanto, antes do início dos auxílios, foi colocada junto à médium uma espécie de televisor, pelo qual podia ser vista cada pessoa ausente, citada naqueles papéis. Dessa forma, os benfeitores “a distância, contemplavam-lhe a imagem, recolhiam-lhe os pensamentos e especificavam-lhe as necessidades, oferecendo a solução possível aos pedidos feitos.” Porém, para recolher todas essas informações, “trabalhadores das nossas linhas de atividades são distribuídos por diversas regiões, onde captam as imagens de acordo com os pedidos que nos são endereçados, sintonizando as emissões com o aparelho receptor sob nossa vista.” Ou seja, é importante que o endereço seja informado justamente para que essa equipe possa se distribuir entre as regiões contempladas, coletar as informações necessárias sobre os reais problemas dos encarnados e implementar as soluções mais adequadas. Com essa informação, não pretendemos dizer que todos os trabalhos mediúnicos ou de irradiação ocorrem exatamente dessa forma, mas que há coerência na ação de reunir nomes e endereços das pessoas para as quais será direcionada a tarefa. Importante é notar que detalhes sobre o problema enfrentado pela pessoa acabam sendo secundários, pois os Espíritos verificam a real necessidade. Todavia, quanto ao endereço, se concordamos que é possível que eles o obtenham de alguma outra forma, informá-los previamente pode facilitar sua ação.

Uma objeção que tem sido apresentada a essa prática decorre de preocupações com o sigilo das informações. Afinal, devemos sempre ser cuidadosos ao revelar problemas e mesmo o endereço de terceiros, garantindo que esses dados fiquem restritos aos trabalhadores do grupo de irradiação. Contudo, se essa equipe é séria e real adepta dos preceitos espíritas, jamais ferirá a ética cristã e passará a pessoas alheias à tarefa informações sobre aqueles a quem se deseja sinceramente ajudar.

Chamamos ainda a atenção para outro artigo dessa edição, “Magnetização mental”, que apresenta um interessante exemplo de prática de irradiação narrado por Kardec.


[1] FEDERAÇÃO ESPÍRITA BRASILEIRA. Orientação para o Atendimento Espiritual no Centro Espírita.

Disponível em https://www.febnet.org.br/portal/wp-content/uploads/2019/07/Orientação-para-o-Atendimento-Espiritual-no-Centro-Espírita.pdf. Acesso em 11 mai. 2021.

[2] ALIANÇA MUNICIPAL ESPÍRITA DE JUIZ DE FORA. O que é irradiação? Disponível em https://amejf.org.br/dae/. Acesso em 11 mai. 2021.

[3] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 282.

[4] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 247.

[5] KARDEC, Allan. A Gênese. 1a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2009, c. 14, i. 16.

[6] KARDEC, Allan. A Gênese. 1a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2009, c. 14, i. 18.

[7] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 656.

[8] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 662.

[9] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 457.

[10] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 2a ed., Rio de Janeiro: FEB, 2010, q. 257.

[11] XAVIER, Francisco Cândido. Entre a terra e o céu. Pelo Espírito André Luiz. 27ª ed., Rio de Janeiro: FEB, 2015, c. 1.

[12] XAVIER, Francisco Cândido. Nosso Lar. Pelo Espírito André Luiz. 59ª ed., Rio de Janeiro: FEB, 2007, c. 50.

[13] Ver também Nos domínios da mediunidade, c. 14 e 19, Ação e reação, c. 12 e 13, No mundo maior, c. 10, e Missionários da Luz, c. 7 e 9.

[14] XAVIER, Francisco Cândido. Nos domínios da mediunidade. Pelo Espírito André Luiz. 36ª ed., Rio de Janeiro: FEB, 2017, c. 16.

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1 Resultado

  1. Solange disse:

    Ótimo estudo sobre a irradiação. De grande proveito nesses momentos que não podemos estar presencial .

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